Entrevista a João Sérgio Reis, Ibéria
Informara-me que teria a oportunidade de apresentar uma lenda da nossa cultura musical para o nosso ciclo de entrevistas. De facto até aparece no wikipédia (Qual lenda não tem uma descrição detalhada no wikipédia?!?!) Com muita honra hoje é a oportunidade de ouvir João Sérgio Reis, Baixista dos Iberia.
Obrigado pela disponibilidade.
Fala-nos um pouco sobre ti, como começaste no mundo da música?
– Eu é que te agradeço a oportunidade, é um prazer! Comecei cedo aos 12 anos, quando eu e os meus companheiros (alguns deles estiveram mais tarde nos iberia comigo…) nos juntávamos nos bancos de escola, nas portadas da nossa rua, aprendendo a tocar guitarra acústica e a imitar as músicas dos nossos ídolos… Penso que nos anos 80 isso foi uma característica inerente a quase todos os que estavam a começar a dar os seus primeiros passos. Nós não fomos excepção e eramos uns miudos, tinhamos vivos todos os sonhos.
E na altura quem eram os teus “bass heroes” e influências?
– Desde cedo ouvi muita música, nomeadamente a que o meu irmão mais velho (Paulo Jorge Reis) trazia para casa: Beatles, Rolling Stones, Doors, Genesis, Deep Purple, Led Zeppelin, Queen, Black Sabbath, alguma new wave e Punk (Ramones), entre tantos outros. Os meus idolos, a partir do momento em que me comecei a aperceber do valor musical dos instrumentos e a distingui-los uns dos outros, foram o Neil Murray (dos Whitesnake), Glenn Hughes e Roger Glover (dos Deep Purple), John Paul Jones (dos Led Zeppelin), Phil Lynnot (Thin Lizzy), Geezer Bluter (Black Sabbath) e (entre muitos outros ainda) o meu principal ídolo no baixo, Steve Harris dos Iron Maiden, que começava a dar nas vistas pela sua técnica, pela sua maneira de tocar, pela sua garra e pelo músico completo que ele é, em especial pela faceta de compositor, normalmente uma tarefa nunca muito “entregue” aos baixistas… Isso em especial intrigava-me e levou-me a querer conseguir vencer nesse meio que tanto me fascinava.
Para além de teres fundado os Iberia, qual consideras o teu maior feito musical?
– No campo pessoal, ter sido considerado durante 5 anos consecutivos o “título” de melhor baixista nacional de Metal, pelo inquérito nacional que o HMZP promovia, através de votação nacional… Vale o que vale, mas com 20 e poucos anos deixava-me imensamente satisfeito.
No campo da banda em si: o ter enviado o album “IBERIA” ao Tommy Vance e ele o ter passado (o tema “No Pride”) no programa “The Friday Rock Show” da BBC-Radio 1, perante mais de 20 milhões de ouvintes. Foi um momento mágico, entre muitos que já tive com os IBERIA!
Entretanto a banda estava lançada e de repente ficou em “banho-maria”. O que te levou a relançar os Iberia ao fim destes anos e o que mudou nos Iberia para além dos membros?
– O que me levou a levantar de novo os Iberia foram as reedicções dos 2 primeiros discos em CD e uma vontade imensa de mostrar às gerações mais novas (e não só…) o nosso trabalho, nuns moldes mais modernos, mais definidos, com as condições técnicas mais recentes. O bichinho “Iberia” não deixou de estar presente ao fim de tantos anos e sentia que a carreira tinha sido brutalmente interrompida sem de facto ter mostrado o valor dos Iberia às pessoas. Juntei os elementos que ainda hoje compõem esta formação e lançámos mãos à obra.
Falemos agora do João Sérgio, o baixista. Para ti o baixo tem de se tocar com os dedos ou aceitas quem toca com palheta? Notas diferenças?
– Dedos sempre, lol… Não tenho qualquer tipo de complexo com quem toca de palhetas ou de dedos! Seria idiota da minha parte… aceito que a pessoa deva tocar como se sente bem, e como acha que soa melhor… eu toco sempre de dedos, mas se me derem uma palheta também farei o meu trabalho… mas com os dedos estou muito mais á vontade. Tenho muito mais amplitude, mais rapidez e mais sensibilidade quando sinto os dedos em contacto com as cordas… a palheta limita-me imenso essa sensibilidade mas consigo tocar de palheta, claro. Como também toco guitarra, consigo adaptar-me perfeitamente, se for necessário.
Faz-nos uma tour pelo teu gear (Amps, Pedais, Racks, Cabos, etc):
– Tenho um amplificador de baixo Tube Works com Cabeça de 300W + 2 colunas e uma Rack Gator com Equalizador Nady Systems, Compressor Behringer, Emissores AKG (dual) e um Power Source da Samson.
Uso uma pedaleira de efeitos Boss ME8B, Microfone Shure SM58, Cabos Klotz e Neutrik, Straps Shaler, Stands da Quick Lock e uso em casa para compor um Marshall Mosphet 100 W + Processador de efeitos Yahama e uma guitarra eléctrica Jackson Flying V com pickups EMG e Seymour Duncan. Já tive muito mais material, mas desfiz-me dele e presentemente é o que tenho e chega perfeitamente para trabalhar nos Iberia e nos projectos que tenho em mente.
E baixos…quais são? Qual deles é o teu preferido?
– Tenho 4 baixos presentemente: o Fender Precision Bass Special SR-1, o Ibanez Sound Gear 800 (equipado com picks PJ da EMG), o Peavey T-40 e o velhinho Aria Pro II com que toquei nos 2 albuns dos Iberia e que me acompanhou durante anos… está no activo (foi restaurado/melhorado recentemente…), mas os 3 primeiros são aqueles que uso presentemente. O Aria está presentemente no Museu, eheh.
E quais os pickups que usas mais?
– EMG, Bartolini e Peavey.
Se tivesses de escolher única e exclusivamente 3 pedais do teu arsenal quais seriam e porquê? (por favor, não te esqueças de dizer a marca!)
– Como já disse, uso somente a pedaleira da Boss ME8B que tem os efeitos que pretendo para já.. na verdade não a costumo usar muito ao vivo, usava-a para outros trabalhos, nos Iberia quero um som duro e possante, sem efeitos. Isso basta-me e penso que não se enquadra (o seu uso) no trabalho que faço com a banda.
Que tipo de cordas utilizas? Usas diferentes afinações?
– Costumo usar muito as Warwick (rotulo vermelho) que têm um bom som e muito brilho; em relação preço/qualidade são excelentes! Já usei GHS Boomers, Rotosound e outras, mas acredita que as Warwick dão muito melhor rendimento! Uso a afinação que tocamos com os Iberia (meio tom abaixo do standard) e no tema Angel desafinei o Peavey T-40, com cujo baixo toco o tema em questão, para drop D (o Mi bordão somente).
És muito exigente em relação no ajuste dos teus instrumentos?
– Não muito exigente, desde que estejam afinados e que tenha uma margem confortável para tocar… não gosto de escalas muito baixas, nem muito altas.. o “meio termo” é o ideal para mim.
Tens algum patrocínio? Se sim, como o conseguiste?
– Não, nunca tive necessidade de recorrer a nenhum patrocínio e não tenho nenhum endorsement presentemente. No futuro não sei, mas gostava da Fender, por exemplo…
Que conselhos podes dar aos baixistas portugueses para que possam evoluir musicalmente? (técnica e metodicamente):
– Os conselhos são sempre muito subjectivos. Não acho que tenha “estatuto” técnico para dar conselhos seja a quem for. No entanto aconselho todos os que agora começam a não porem a “carroça á frente dos bois”. Aprendam a andar, antes de saberem correr. Ninguém disse que é fácil e não se deixem iludir: só se consegue algo com muito trabalho e dedicação, tenham a certeza disso! A sorte também ajuda, é um facto, mas sem trabalho nada se faz.
Sejam metódicos numa coisa: treinem, ensaiem. Ao contrário do que dizem muitos, os ensaios são necessários e fazem evoluir um músico e/ou uma banda. O entrosamento duma banda começa-se a notar com a frequência de concertos e também de ensaios. Os Iberia no final dos anos 80, ensaiavam TODOS os dias! É difícil hoje em dia cumprir um tal calendário – seja pela falta de tempo, seja pela falta de salas para ensaiar, outro drama das bandas de hoje – mas pelo menos pratiquem quando podem e tentem tirar partido duma coisa que eu não tive acesso quando comecei: a tecnologia e os métodos de aprendizagem (Vídeos, Livros, Internet, Workshops, etc..).
Aproveitem e divirtam-se a aprender, tenham prazer nisso, não façam disso um martírio, e muito menos uma competição… esse, quanto a mim, é o caminho mais errado. Para rematar uma coisa demasiado importante: não se deixem pisar por ninguém, mas sejam humildes, sem isso não passam da cepa torta, disso não tenham dúvidas nenhumas.
Como disseste, hoje os meios para se fazer música estão muito mais acessíveis ao grande público. Achas que isto satura o mercado ou há espaço para todos?
– Satura de facto o mercado. Parece pretencioso da minha parte dizer isto, mas se por um lado existe espaço para todos mostrarem a sua música, por outro há muita gente que tem meios e faz trabalhos muito maus, medíocres mesmo e safa-se com isso (seja por lacunas do mercado, seja por influência de alguém, seja por terem meios e dinheiro e consigam “comprar” o seu lugar).
E temos bandas excelentes com muita capacidade e talento e pela escassez de meios e de oportunidades, o seu trabalho fica muitas vezes por mostrar; há neste campo uma lacuna enorme: as editoras com visão para investirem em bons projectos e a lógica economicista que ainda (e cada vez mais) grasa no meio artístico em Portugal. E somos um país pequeno. Isso faz toda a diferença. Não tenham a menor dúvida que isto está muito limitado por isso. Mas nunca desistam de lutar pelo vosso lugar..
Concluindo, podes falar-nos um pouco sobre os teus projectos presentes e futuros?
– Para já o que me interessa a nível musical, são os IBERIA. A banda tem um novo disco (REVOLUTION) lançado em Março deste ano, estamos ainda a promovê-lo, ainda há imenso que fazer e o disco ainda não mostrou todo o seu potencial às massas. Queremos tocar ao vivo, exportar a banda e estamos a fazer todos os esforços possiveis para que isso seja possível.
No futuro tenho duas coisas que gostaria de conseguir fazer: re-gravar uma colectânea com os melhores temas dos primeiros álbuns (com a tecnologia de hoje) e criar condições para montar um mini-estúdio em casa, coisa que me ficou pelo caminho há uns anos atrás, aquando da paragem forçada da banda e da minha actividade. Nunca parei,
verdadeiramente, mas houve uma lacuna na minha carreira e foi essa.